terça-feira, 14 de outubro de 2008

Nick Drake

Disco: Bryter Layter
Estilo: Outono
Quando: 1970
Onde: Myanmar -> Inglaterra


Ainda me lembro de ouvir Pink 
Moon, em meio a uma conversa de amigos, falando como Nick Drake é bom. Eu ouvi o disco, fiquei com aquela sensação de "não saquei". Ouvi duas, três, e lá pela décima vez eu ainda estava, "What the fuck?! Pra um cara que foi pra Cambridge eu esperava um pouco mais de coesão nessas letras." Coesão. Eu nem pedi por complexidade acadêmica. Coesão é o mínimo a se exigir hoje em dia, quando nossa tão almejada e alcançada liberdade tem se mostrado como nosso maior vício e permitiu o impermissível. Cicrano vai lá e escreve sobre seu sentimento mais difícil de ser expressado. Canta um mundo complexo, onde não se tem nada a falar. Um mundo que não dá nem pra saber o que vai acontecer de manhã porque você não consegue olhar pela janela de manhã de tanta gente que tem por aí. Aí você chega pra um camarada desse e pede pra ele ir devagar, porque nebuloso já tá ficando o entendimento da primeira meia dúzia de versos que ele cuspiu em cima de você achando que tá tudo muito claro.
 Mas tudo bem. Apesar de tudo, somos livres. A gente rola escada abaixo tremilicando feito um verme, espalhando tinta guache vermelha na parede da faculdade de artes, e depois entende que aquilo era uma "performance". Seus olhos captam um mendigo na rua colocando bituca de cigarro dentro de garrafas plásticas e as vendendo, e como se não fosse o bastante, ao lado, uma estudante de jornalismo conversa com o artiste, preparando uma grande reportagem. Afinal, olha que obra sensacional a dele! Ele captou aquele sentimento inexprimível que eu falei acima. Deu pra sacar? Ele é um cara complexo! Inteligente! 
Mas quem se importa com esse vício? Somos livres como pássaros.
Quando eu vejo essas coisas eu acho que to ficando velho, que tudo passa muito rápido e que eu tenho uns resquícios de passado.
Foi assim com o Nick. Assim, até eu ouvir o Five Leaves Left, e então, o Bryter Layter. Aí, eu vi um videozinho, que falava que em Cambridge ele só estudou dois anos e se encheu. Não ia nas leituras, ficava sentado no banquinho olhando essa raça deprimente de artiste com desdém e não estava nem aí em ser um cara profundo. Aí que tudo começou a fazer sentido, e eu parei de achar que Nick Drake é um cara superestimado. Não é que ele foi simplista. Longe disso. É que ele foi mundano. Fiquei até aliviado em ouvir descreverem a música dele como música de outono. É exatamente isso. Não só as folhinhas de Maple caindo amareladas, mas o clima de convalescência, de preguiça, de tédio, de aceitação...resgatando uma mágica perdida. Cantando um mundo simples, nem um pouco nebuloso, finalmente se exprimindo com poesia legível.
Depois de entender as letras do Nick eu me acalmei, assinei embaixo do "Nick Drake é foda", parei de praguejar sobre os poetas e artistas livres das últimas décadas e fui pensar porque cargas d'água eu dei uma porção de chances pro disco dele. Nada mais normal que deixar de lado aquele disco que depois de umas três ouvidas ofendeu sua inteligência. Mas o porque eu insisti ainda me intrigava.
Bem, só sobrou uma coisa: a música.
Ah! É! A música. Vamos à ela.
Falar que ele é folk é sacrilégio. O violão é articulado demais, fora do usual quatro por quatro,um dedilhado muito cristalino pra colocá-lo nesse nicho caipira. E apesar de inúmeros arranjos de cordas, sopros, pianos, um charmoso double bass e até um cravo cantarolando de mãos dadas com o violão, Nick Drake soa sozinho. Nick Drake e Sua Banda. É nítido até demais como ele é um artista solo que nem pôs o dedo nos demais arranjos. Fica o dedilhado e aquela voz. Que voz! Como Joanna Newsom, sua voz é um gosto que se adquire. Fraca, meio pra dentro, sempre no mesmo volume, que com o passar do tempo vira uma voz charmosa, rica em detalhes e que passa realmente uma paz de outono. 
Sua harmonia é padronizada. Você sempre sente quando virá aquela passagem de acorde sombria, que te joga em outra direção e mostra mais uma faceta das várias. De um músico diversificado, escritor tocante e coerente, que infelizmente se matou porque sentiu que não teve sucesso em atingir as pessoas como queria. Isso eu não posso questionar. Não sei quais eram seus planos. Mas tenho certeza que ele tocou uma geração em sua época, e mais uma agora. Acredito que já é o suficiente pra se chamar de música atemporal. 
Já o artiste das bitucas...Bem...

Porque baixar? - "As simple as a kettle, steady as a rock".




4 comentários:

Lani Romée disse...

"Ainda me lembro de ouvir Pink
Moon, em meio a uma conversa de amigos, falando como Nick Drake é bom."

Você não tem amigos. Curta bastante seu Nick Drake.

Vanni disse...

Você também não tem amigos e ouve L'Ocelle Mare.
Ganhei.

Lani Romée disse...

Eu nunca disse que tinha. Você ouve Nick Drake. Ganhei.

Nick Drake Brasil disse...

Muito legal o texto.

Aproveito para divulgar meu novo Blog, o Nick Drake Brasil,

nickdrakebr.blogspot.com

Abs,

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